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Entrevista de Domingo

Entrevista de Domingo: Maurício Juvenal fala sobre as perspectivas para o ano de 2022

Diretor da Badra Comunicação e do Portal BS9 comentou sobre política, economia e turismo

Redação BS9

02/01/2022 - domingo às 15h23

Por Alexandre Fernandes e Lucas Campos

Maurício Juvenal se diz um santista de nascimento e mongaguaense de coração. Mas tem uma relação tão longa com as outras sete cidades da Baixada Santista que é como se fosse um munícipe de cada uma delas também. Não é um exagero. Ele pode, por exemplo, não ir a Bertioga, mais ao norte da região, ou a Peruíbe, no outro extremo, com a mesma frequência que ia em outros tempos. Mas está mais antenado à realidade desses lugares do que muitos moradores.
 
E isso se deve, principalmente, a outros dois "filhos" que Mauricio tem, além da Ananda, do Pedro e da Alicia. Um é a Badra Comunicação, empresa especializada em pesquisa de opinião e monitoramento de dados e informações aplicados à gestão pública. E o caçula é o Portal BS9, nascido em maio do ano passado, com a proposta de dar voz aos nove municípios da Baixada, sem privilegiar os "primos ricos".
 
Mas se mesmo a Badra e o BS9 não ficam restritos à região, não dá para falar só disso com o Maurício nesta primeira Entrevista de Domingo de 2022. Estamos a menos de um ano de eleições para presidente, governador e cargos parlamentares. E nada melhor do que ter a opinião do diretor-presidente de uma empresa especializada em pesquisas para falar um pouco sobre o papel que elas terão no pleito.
 
A experiência de Maurício Juvenal na política, no entanto, vai além da realização de pesquisas de avaliação ou intenção de voto. No governo de São Paulo, já foi secretário adjunto de Turismo na gestão de Geraldo Alckmin (2011-2014) e secretário de Planejamento e Gestão na gestão de Márcio França, de abril a dezembro de 2018. Bagagem que lhe permite falar com propriedade sobre diversos temas de grande interesse para os paulistas, como saúde, educação, desenvolvimento e até do valor do IPVA.
 
Como você verá na resposta de uma das 9 perguntas, Maurício acha que 2022 vai ser difícil. Pode até ser. Mas com uma Entrevista de Domingo tão recheada e com tantos assuntos abordados, o Portal BS9, pelo menos, inicia o ano com o pé direito.

1- 2022 começa pelo apelo da retomada econômica, e com o desafio de ainda vencer a pandemia. Como você vê a atual situação econômica nos dias de hoje e o que podemos esperar de 2022 na sua visão de gestor?
Tudo aponta para um ano tão difícil quanto 2021 ou mais. O que se acreditava, até então, é que 2021 seria marcado pela retomada econômica, mas não é exatamente isso que estamos assistindo, uma vez que os efeitos da pandemia têm afetado esse processo de recuperação de forma bastante heterogênea. Se por um lado você tem o mercado de trabalho dando sinais de recuperação, por outro você tem a renda média do trabalho em seu pior patamar dos últimos dez anos, com uma retração de mais de 11% quando comparada com o mesmo período de 2020, já um ano de pandemia. Na prática, salários menores. Se a gente pensar em termos de setores, serviços e comércio, aqueles que sobreviveram, até já têm se beneficiado da melhora das condições sanitárias, mas a indústria sofre com a alto custo da energia e a escassez de matéria-prima. Por fim, e ainda que pareça pessimismo demais, estaremos em um ano eleitoral, período em que tradicionalmente os investidores optam pela cautela em função da imprevisibilidade em termos de política econômica. Tende de fato a ser um ano bem difícil.
 
2- O que ainda é necessário para que o País encontre a direção que atenda o social e o desenvolvimento?
É preciso parar de imaginar que são coisas excludentes entre si. Só há verdadeiro desenvolvimento econômico quando ele se dá de forma interligada com o meio-ambiente, com a educação, com a cultura, convergindo para a melhora da qualidade de vida das pessoas, como um todo. E que fique claro que estamos falando em desenvolvimento econômico e não em crescimento econômico, algo portanto que vai além do aumento de produção e do resultado do PIB. O desenvolvimento econômico propõe a melhoria da qualidade material e do quadro social geral de um país com o aprimoramento da distribuição de renda, crescimento na taxa de cidadãos alfabetizados, índices de natalidade e mortalidade, redução da violência, entre outros aspectos sociais que determinam o bem viver social. Em resumo, se um país gera uma renda per capta que aumenta gradualmente a cada ano, mas apresenta um baixo índice de melhorias e desenvolvimento na direção do povo, não é possível denominá-lo como desenvolvido.

3- De acordo com sua vivência e análises científicas de pesquisas de opinião pública realizadas pela sua equipe, como você acredita que pode ser desenhado um novo quadro político para os próximos tempos?
Tudo leva a crer que um novo quadro político, não. Mas um quadro político diferente, sim. É engraçado que a exemplo da economia brasileira, a política brasileira também é bem volátil. Muitos lastrearam a derrota da esquerda na última eleição presidencial na falta de união dos partidos que pregam essa posição política. Agora, quatro anos depois, o que se percebe é uma direita fragmentada, em busca da identificação de um ator, quem diria, que verdadeiramente a identifique. Bolsonaro, Moro e até João Doria disputam esse espaço e tendem a morrer abraçados. Na verdade, vivemos um dos momentos mais pobres de toda a história política brasileira, com lideranças fracas, do ponto de vista do conteúdo, e incapazes de propor um projeto de nação. Nem esquerda e nem direita apresentam um projeto de nação, propostas para o País. Um lado se une para derrotar o que batizaram de mal maior, o bolsonarismo. Já o outro não se une, mas o discurso é evitar a volta do lulismo. E assim outubro de 2022 vai se aproximando, sem que qualquer um desses lados apresente propostas para resgatar o país do abismo em que está mergulhado.

4 - Você esteve à frente da Secretaria que comanda o maior orçamento do Estado do Brasil. Por que o Estado de São Paulo ainda encontra dificuldades de promover a Educação e fortalecer setores importantes de atendimento à população, como a Saúde?
Exclusivamente porque o PSDB não quer. Os tucanos aparelharam o Estado de modo que ele garanta única e exclusivamente a reeleição de um dos seus. A máquina do Estado é imensa, é enorme, com uma capilaridade sem igual, favorecendo e muito quem a controla. O PSDB percebeu isso e faz apenas o suficiente para se manter no poder, repetindo fórmulas e arranjos políticos que permitam a manutenção desse poder. É um ciclo nocivo de quase três décadas. Convenhamos, como um partido que está há trinta anos governando o Estado de São Paulo pode propor algo novo? Se há algo novo a propor, por que não realizaram até hoje? Há uma política de perfumaria, mas jamais sem se aprofundar nas questões que mudam, pra melhor, a vida dos paulistas. Em tese, temos não só os médicos mais mal remunerados do País, como também os professores e a classe policial. Penso, no entanto, que esse ciclo está com os dias contados, e sinceramente não acho que estou enganado. Em dez meses saberemos. No curto período de oito meses que estive à frente da Secretaria de Planejamento e Gestão, durante o mandato do governador Márcio França, conseguimos dar sinais do que é possível fazer com ousadia e vontade política, implantando projetos e disponibilizando recursos, para todas as secretarias, que valorizavam o município e consequentemente o cidadão. Não adianta o Governo do Estado ser forte, controlar o dinheiro, e os municípios ficarem à mingua, com prefeitos o tempo todo com o chapéu na mão, mendigando recursos. Essa política desrespeita quem é legitimamente eleito para governar na esfera mais próxima das pessoas, que é o Executivo municipal.

5- O turismo na nossa região ainda vive grandes dificuldades de ajustes entre os gestores prefeitos das cidades. Por que ainda é complicado esta promoção turística unificada entre as cidades, já que diversos políticos levantam a bandeira da integração, mas o resultado ainda é pequeno?
Exclusivamente por vaidade política. Aliás, de qual Turismo estamos falando. Se estamos falando do turismo de sol e praia, sol e mar, esta promoção turística desde o princípio foi garantida por Deus. Do ponto de vista prático, e em termos de planejamento e execução da atividade turística, é zero e em relação aos nove municípios. Os prefeitos, em seus discursos, falam tanto dessa vocação natural, mas, na prática mesmo, destinam zero vírgula alguma coisa de seus orçamentos para o setor. Não há sequer uma política de incentivo à maior permanência do turista na região. Não há um plano integrado de turismo. Há mais de 30 anos o máximo que a câmara temática consegue colocar na mesa, para discussão, mas não sai do papel, é a bendita história do “selo metropolitano”, acreditando que organizar a entrada de vans e ônibus nos municípios vai melhorar o resultado do setor. Os municípios não casam suas potencialidades, não compõem um roteiro comum que privilegiem o turista, não investem em equipamentos de qualidade que motivem uma segunda volta do turista à região. O rico patrimônio histórico monumental que as nove cidades possuem, assim como o rico patrimônio ambiental, não são explorados. Alguns vão dar risadas, mas nem uma política de incentivo ao veranista não há. Quem mora fora e tem casa na região, tal a falta de estímulo, prefere alugar a casa na alta temporada para pessoas que chegam à região trazendo tudo na bagagem, deixando aqui só o lixo que produzem. E aí não fazem girar a roda do consumo local de bens e serviços. O resultado não é pequeno como está na pergunta. Ele simplesmente não existe. O que existe é exclusivamente graças ao fato de a região ser naturalmente abençoada por Deus.

6- Na sua gestão como secretário de Planejamento de São Paulo diversas cidades foram atendidas com recursos para o desenvolvimento regional. Você encontra estas obras e serviços, que ora foram autorizadas pelo governador de São Paulo da época, em pleno funcionamento e atendendo a população? Lembra de alguma importante que foi autorizada e ora esquecida ou com o atual Governo, abandonada?
Olha, do ponto de vista turístico mesmo implantamos uma série de programas que não foi dada a devida continuidade. O Estado veio, implantou, e esperava que os municípios, provocados, percebessem a importância e a utilidade desses programas. As rotas pedestres são um bom exemplo. O papel do Estado era o de implantar e sensibilizar os gestores municipais sobre a importância da iniciativa como produto turístico. Mas os municípios não abraçaram a ideia. Em geral porque querem resultados imediatos. O Caminho de Compostela recebe anualmente cerca de 500 mil peregrinos e outros dois milhões de “turisgrinos”, gente que vai para lá apenas para ver as pessoas caminharem. Não é uma questão de apontar o dedo para os municípios, como se eles fossem culpados, mas é preciso perceber que a região tem enorme potencial e com um pouquinho de criatividade, e muita disposição, é possível fazer de fato do turismo a principal indústria local de geração de riquezas. Mas é preciso ousar, acreditar, apostar fundo, criar um parque temático no nível dos melhores do mundo, por exemplo, na área continental de São Vicente. Mas enquanto a opção for fazer mais do mesmo, teremos do ponto de vista estrutural exatamente o que temo hoje, ou seja, quase nada. Um detalhe a mais: a cidades do Vale do Ribeira têm que estar contempladas nessa ação, elas têm enorme potencial. Mas convenhamos: nem mesmo quem mora na região sabe ou conhecesse esse potencial do Vale.

7- Falando de política, 2022 também será palco de umas das principais eleições dos últimos tempos, até então acirrada por dois potenciais candidatos à Presidência da República. Além disso, teremos eleição para os Legislativos Federais e Estaduais, e as eleições de Governadores dos estados. Aqui para São Paulo, diante dos números e análises de pesquisas que você comanda, já é possível acenar um cenário para estas eleições?
O que a mim me parece certo é que o Partido dos Trabalhadores, ou o arranjo político que derive da participação da legenda, estará no segundo turno tanto a eleição presidencial quanto da eleição para o Governo do Estado. A não ser que tenhamos uma variável interveniente, algo de força maior que altere os rumos que hoje estão sendo lidos, o PT volta a ter enorme protagonismo nas próximas eleições. E longe de ser por méritos próprios, muito pelo contrário. Bolsonaro e Doria se constituíram, pela inação de seus governos, nos principais cabos eleitorais do PT. Não houve entregas. São três anos, tanto na esfera estadual como federal, sem nenhuma grande obra ou realização, absolutamente nada. Ambos se escondem atrás da pandemia para tentarem justificar o desempenho pífio como governantes. Bolsonaro corre o imenso risco de nem estar no segundo turno e Doria, se candidato a reeleição fosse, tudo indica que terminaria em último na disputa ao governo de São Paulo, tamanha a sua rejeição. Aliás, ele prefere disputar a presidência justamente para não passar vergonha em São Paulo. Perde pra cima. No Estado de São Paulo, a esquerda ou centro-esquerda só perde a próxima eleição se não se unir. Um cenário, aliás, que se repete no âmbito federal.

8- O IPVA de São Paulo é a maior reclamação neste início de 2022, com reajuste na margem dos 30%. A Secretaria da Fazenda de São Paulo, inclusive, prevê arrecadar R$ 21,8 bilhões com o IPVA em 2022. Como gestor, com você viu este reajuste e o que se pode indicar para o Estado de São Paulo aproveitar este valor que arrecadará?
O governador Doria age como um Robin Hood às avessas, tirando dos pobres para dar aos ricos. Ele aumenta o IPVA mas por outro lado cora pela metade o ICMS que incide sobre o combustível de aviação, beneficiando as empresas aéreas. Vai entender. A previsão orçamentária do Estado para 2022 é de R$ 287 bilhões. Em 2018, foi de R$ 217 bilhões. É um crescimento de R$ 60 bilhões, 33%, em quatro anos. Que legal, né? Demonstra a pujança no Estado, não é mesmo? Não, não é. Esse crescimento desproporcional está lastreado em aumento de impostos, em uma carga tributária que mata aos poucos quem empreende, quem investe. Pior, que deixa sem fôlego os menos favorecidos e que espreme ainda mais a classe média. Só no IPVA, o salto, de 2018 para cá, supera os R$ 5 bilhões, sendo que a frota não cresceu na mesma proporção. O próprio governo sentiu tanto o impacto que decidiu dividir o valor em cinco parcelas, como se isso não fosse comprometer da mesma forma o orçamento de quem tem carro. Tamanha insensibilidade, fica difícil entender que boa destinação o governo dará desses recursos. A se lamentar menos uma vez que parte do arrecadado fica para os municípios, cujos prefeitos são mais sensíveis às demandas da população.

9- E para finalizar, gostaríamos de saber como o homem público e cidadão Mauricio Juvenal espera para si e para toda população, o ano de 2022 em diante?
Eu sou santista de nascimento e um mongaguaense de coração que espera apenas que as pessoas possam ser felizes e sentirem realizadas em suas vidas. Nesse sentido, o que cada um faz de sua própria vida é determinante para que esses objetivos sejam alcançados. Mas, não distante disso, os governos, em suas diferentes esferas, precisam colaborar nesse processo. As pessoas não aguentam mais terem obrigações com o Estado, sem que dele derivem os direitos mínimos e essenciais a boa sobrevivência. É constrangedor o número de pedintes nos semáforos das cidades. Constrangedor para quem pede e para quem recebe o pedido. Mais constrangedor, no entanto, deveria ser para quem governa, que demonstra não conseguir, minimamente, resolver uma questão que é plenamente possível do município administrar, cadastrando essas pessoas, oferecendo o suporte que elas precisam, identificando essas famílias e estabelecendo oportunidades, em parceria com o terceiro setor, que permitam algum tipo de ganho, a partir do trabalho, para essas pessoas. É só ter um pouquinho de vontade política. E cito esse assunto porque meu maior e mais sincero desejo é que não vivamos num País onde as pessoas de fato não tenham que se submeter à caridade alheia para que possam comer. Os governos precisam fazer a sua parte.

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