Rosane Farah - Bióloga, responsável técnica pelo Instituto Gremar - Guarujá
Rosane Farah
30/08/2021 - segunda às 16h13
Para as equipes que trabalham com resgate e reabilitação de animais marinhos, o cenário de encalhe envolvendo um grande cetáceo, como por exemplo, a baleia, é sempre desafiador.
A começar pelo próprio porte, afinal, é preciso uma equipe capacitada e numerosa para executar tarefas complexas, desde um eventual desencalhe (no caso do animal vivo), ou realização de necropsia, com toda a logística de materiais e equipamentos para o manejo de um animal que habitualmente pesa várias toneladas.
Nas últimas semanas, vivenciamos isso na prática. Tivemos um aumento considerável de ocorrências com baleias no litoral da Baixada Santista. E muitos têm nos perguntado se há algum motivo específico que tem provocado isso.
Primeiramente, vale a pena mencionar que todos os encalhes registrados na região envolveram baleias jubarte, cujo nome científico é Megaptera novaeangliae – que significa “grandes asas da Nova Inglaterra”, por conta das enormes nadadeiras peitorais, que podem chegar a ter 1/3 do comprimento do corpo; e também em referência aos Estados Unidos, onde a espécie foi identificada pela primeira vez.
Anualmente, essas gigantes dos mares realizam uma longa viagem a fim de completar seu ciclo de vida. Durante o verão, a população, que se reproduz ao longo da costa brasileira, migra para os mares antárticos para se alimentar, local onde o oceano é extremamente rico em nutrientes; depois, retorna ao nosso litoral no período de inverno e primavera, para acasalar e cuidar dos
seus filhotes.
Após anos de luta contra a caça histórica e de larga escala, direcionada à coleta de gordura, carne e ossos - responsável por reduzir absurdamente as populações de baleias em âmbito global – o trabalho do Projeto Baleia Jubarte e seus parceiros resultou em uma maior proteção, consequentemente, na recuperação da espécie. Em 2014, ela foi inclusive retirada da Lista Oficial de Espécies Brasileiras Ameaçadas de Extinção, sendo um grande marco a ser comemorado.
Sete anos depois, porém, o cenário volta a trazer dados alarmantes. Segundo o Projeto Baleia Jubarte, já foram registrados mais de 130 indivíduos mortos encalhados em toda a costa brasileira, desde o início de sua temporada.
Ainda é cedo para saber ao certo quais as principais causas dessa mortandade. É fato que ações naturais (fenômenos climáticos, patologias e até mesmo o aumento populacional) podem ser listadas entre elas, porém, é mais provável que isto esteja ocorrendo por conta do aumento do impacto das ações antrópicas (provocadas pelo homem), visto que já tivemos casos envolvendo interação com pesca (em redes de emalhe), atropelamento por embarcações e escassez de fonte alimentar.
O Gremar, apenas em 2021, já foi responsável pelo exame de necropsia de 5 animais que encalharam nas praias de Bertioga (1), Santos (2) e Guarujá (2), área de atendimento do Instituto através do Projeto de Monitoramento de Praia (PMP- BS), projeto desenvolvido para o atendimento de condicionante para o licenciamento ambiental das atividades da Petrobras na Bacia de Santos, conduzido pelo Ibama.
Quando realizada a necropsia, são coletadas amostras para posterior análise, com o intuito de auxiliar na investigação da causa morte e sustentar estudos mais aprofundados sobre a atual situação das espécies.
E por que é tão importante proteger e estudar esses animais?
Além do carisma e do encanto que proporcionam ao serem avistadas, as baleias exercem um papel fundamental para a saúde de todos nós.
Além de serem “guarda-chuvas”, ou seja, importantíssimas para a existência de várias outras espécies, elas também são essenciais para o ecossistema, pois fertilizam o ambiente, propiciando um aumento considerável nos níveis de ferro e nitrogênio no ecossistema das algas. Com isso, facilitam a proliferação do fitoplanctons, que realizam o processo de fotossíntese e, portanto, removem o gás carbônico na atmosfera, minimizando o efeito estufa e tornando mais puro o ar que respiramos.
Somente compreendendo o papel ecológico desses animais e através da educação ambiental, seremos capazes de conviver harmoniosamente com o meio que vivemos. As baleias, assim como milhares de outras espécies, são fundamentais para mantermos nosso planeta vivo e nos mantermos como espécie.
Que a beleza e as lições que nos deixam esses animais possam cada vez mais inspirar nossas atitudes.
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